Em algum momento de 2021…
Por Carmen
A gente se olha muito, sem parar, mas mantemos a habitual distância de mais de um metro. Os olhos dela brilham intensamente. É nosso segundo encontro e, demos um passo além: tiramos as máscaras. Eu já tinha visto o sorriso aberto, o canino charmosamente torto, nas fotos que ela havia enviado, mas assim, ao vivo, uau.
Chegar mais perto me bota medo. Há quase dois anos, não encosto em ninguém. Moro sozinha, vejo família e amigos eventualmente, mas o espaçamento já virou rotina. Abraços são uma lembrança aguda e vistos como fraqueza, como o chocolate para o diabético. Tem gente que cai na tentação, claro, não dá pra julgar, mas arca com a consequência de ter de passar por testagens contínuas e higienizações diárias – um protocolo que nasceu no Japão e foi exportado para o mundo todo.
Desde que a conheci, a vontade de tocar, abraçar, beijar voltou como uma onda de ressaca. Ela está na minha casa e propõe seguirmos adianta com o nosso jogo de excitação. De pé, lentamente tira os sapatos, o shorts, a camiseta. Vejo seu sutiã e calcinhas brancos, de algodão, o corpo magro e torneado. Sinto arrepios nos braços e na barriga.
Mimetizo seus movimentos no outro extremo do tapete. Tiro, sem pressa, a saia, a blusa. Percebo que ainda estou de meias, e me abaixo. Minha lingerie não é muito diferente da dela.
– Você teve já?, ela pergunta.
– Não…E você?
– Tive, logo no começo, leve.
– Acha que está imunizada?
– Não sei, tem sempre um risco.
– Quero tanto te tocar…
– Há quanto tempo você não beija, não transa?
– Desde o início de tudo.
– Eu também.
Sinto meus olhos marejados. No abdômen, logo abaixo do peito, converge toda a minha ansiedade. Volto a me concentrar no corpo dela, na curva do quadril, no recheio do sutiã, os pelos escuros na transparência da calcinha. E aí sinto a energia migrar para o ventre, o tesão tomando conta.
Não dá mais. Toda solidão, toda carência, todo receio são puxados para longe por esse oceano revolto. Pareço a menina do interior que só vai à praia uma vez por ano, caminho sem jeito pela areia fofa do tapete e mergulho no mar. Ao toque dela, viro espuma e flutuo.
É bom estar viva.