Quando tá foda, beijo, beijo, beijo
“Naquela semana, acordei com vontade de beijar. Beijar. Eu precisava beijar beijar beijar. Veja: eu precisava beijar na boca, beijar de língua, beijar sem língua, beijar seco, beijar molhado, beijar bitoca, beijar bocão, beijar miudinho, beijar escandaloso, beijar-morder, beijar-beliscar. Beijar tórax. Beijar mãos. Beijar rosto liso – porque barbão já enjoei. Beijar canto de boca. Beija-não-beija, tipo cai-não-cai, tipo quase beija mas não beija e depois beija. Eu precisava.
Mas tava sem boy. Porque hoje em dia tá foda. Quer dizer. Foda tem pra todo canto. Foda amiga. Foda fodida. Tem mais foda fodida que foda amiga foda boa. Mas tá foda. E então comecei a pensar na minha lista de amigos de foda do bem. Liguei pra ele:
– Cleber, sábado tem forró. Tenho VIP porque é mês do meu aniversário. Bora?
– Ah, gata, esse sábado não vou poder.
Foda. Caralho. Eu queria beijar uma boca amiga porque, porra, tava sem paciência. Fui pra lista do feicy. Hum, esse sim, esse talvez, esse de jeito nenhum, esse claro. Fiz até planilha. Porque, olha, tá fácil não.
Nada. Ninguém podia. Era homem agora já comprometido, homem que tinha compromisso na casa da mãe, homem que tinha voltado pra casa da ex-mulher – ô bananada fiadaputa! –, homem que tava experimentando agora com homem, homem que tinha tido filho sem querer, homem gripado, homem brocha ainda se acertando com o antidepressivo. Nada. Todo mundo não podendo.
Fui pro forró sozinha. Sedenta por beijo beijo beijo. Pense numa pessoa boca rígida. Eu. Pense numa boca horny. Eu. Pense numa boca Pac-Man. Eu aqui. Era noite de “forró no escuro”, já ouviu falar? Pois era assim. Melhor. Porque eu não tava em condição de ficar com frescura. Na entrada, vejo aquele cara Forró no Escuro passado, um que dancei a madrugada inteira e que no final queria ficar comigo. Naquela noite, deu 2 da manhã e a homarada ficou louca, saindo catando tudo quanto era mulher, querendo ganhar a noite antes que acabasse. Pois comigo não. Naquela noite. Essa era outra história.
Dançamos uma, duas, três. Ele me reconheceu. Tinha um cheiro bom que minha nossa. A camisa dele cheirava a amaciante. Aaaaah, eu fungava. E dançava, dançava. Mas nada de beijo. Eu sou tímida. Por dentro eu tava abocanhando aquele homem magro, uma vareta, alto alto alto, por dentro minha mão tava no saco dele, apalpando, apertando aquela ponta de pinto semiduro, enquanto as mãos dele se perdiam dentro do meu sutiã tamanho 50. Mas eu sou tímida. Então esperei.
Terminou a música, ele sumiu. Cadê o moço, gente, cadê aquele um cuja boca eu abocanho hoje mesmo? Nada. Desapareceu. Dancei com uns e outros. E eu pensando na boca alheia. Dancei com homem que precisava de 100 aulas de dança de salão. Dancei com homem com suadouro. Dancei com homem coxa do caralho. Dancei com homem baixo. Dancei com dois homens ao mesmo tempo – essa dança aí foi gira. E o homem-vara desaparecido. Ele deve estar com outro. Filho da puta. Volta aqui que você vai ver. De repente, quem me tira pra dançar naquele salão escuro escuro escuro? Ele. Funguei pra sentir se tinha cheiro da outra. Tava a fim de uma boca só pra mim. Não senti cheiro de nada. Deve ter lavado o rosto. A banda começou a tocar uma música que mandava passinho de testa com testa. Vai ser agora. Foi.
Beijo beijo beijo beijo. Cinco laudas digitadas com beijo beijo beijo beijo. Pense. Foi língua, foi seco, foi bocão, foi boquinha. Mão boba pra tudo quanto é lado. Beijo beijo beijo. Ai que delícia minha nossa senhora. Beijo, mão no saco. Beijo, mão no peito. Beijo e prensa na parede. Ele me levou até a parede disponível e tome beijo beijo beijo. Tava frio mas tava calor. Beijo. Desabotoa aqui, abre o zíper ali. Encaixa o pinto na xana. Segue o compasso, vai no ritmo. Vai, vem, vai, vem. Beijo. Forró no escuro. Vai, vem, vai, vem. Beijo de língua. Prensa na parede. Gozo. Porra.”